Você, leitor, por motivos talvez financeiros, mantém um carro mais “velho”, com uma pintura e estrutura desgastadas que ninguém leva fé? Você pede passagem e o vizinho de rua nao dá? Os motoristas com os “carrões do ano” olham com desdém e fazem manobras ignorando sua presença? Seu carro já estancou ou quebrou na rua gerando filas de carros atrás buzinando com os motoristas disparando frases como “Tira essa lata velha daí”? Se a história lhe soa familiar, você pode ter sido vítima de discriminação no trânsito.
O professor de história Cláudio Nascimento tem uma Parati 1995 e conta que, certa vez, uma senhora trancou o carro dele e, sabendo que estava certo, baixou o vidro para reclamar. “Quando fui dizer que ela me trancou, a mulher fez gestos obscenos para mim e foi embora disparada na minha frente”, revela. Depois, Cláudio foi seguindo atrás dela porque queria ir para a mesma direção, mas a motorista pensou que ele a estava perseguindo. “Ela parou o carro para ver se eu ia em frente ou se ia parar também. Ficou com medo que eu fosse fazer algo com ela. Agora, acho que se eu tivesse um carro do ano, ela não pensaria isso”, expõe.
Cláudio ainda comenta também ser vítima dos pedestres nas ruas, quando ele acelera o veículo e as pessoas fazem caras feias, encaram e tapam o nariz por conta da fumaça que sobe pelo cano de escape. “Eu não posso fazer nada diante disso, se não posso comprar outro carro”, pontua.
Quem tinha tudo para sofrer preconceito era o Fusca 1978 compartilhado pelos 13 organizadores do bloco carnavalesco “Não acredito que te beijei”, cujo símbolo é o besourinho. Segundo um dos jovens, Guilherme Valente, quando o Fusquinha dá problema, todo mundo do bloco sai empurrando, como uma forma de brincadeira. “Se fosse no dia a dia do trânsito normal, as pessoas não teriam essa reação”, pontua.
Ainda segundo Guilherme, ter um carro mais velho deixa um pouco a desejar no quesito conquista, porque as mulheres preferem sair com rapazes que têm os chamados “carros do ano”. “No entanto, não acredito que seja um motivo final para não querer sair com a pessoa”, declara.
Em relação a infrações:
Código 6653
Conduzir o veículo com descarga livre ou silenciador de motor de explosão defeituoso, deficiente ou inoperante.
Infração grave, menos 5 pontos na CNH e multa de R$ 127,69
1.060 infrações aplicadas em 2010
Código 6726
Conduzir o veículo em mau estado de conservação, comprometendo a segurança, ou reprovado na avaliação de inspeção de segurança e de emissão de poluentes e ruído
Infração grave, menos 5 pontos na CNH e multa de R$ 127,69
2.801 infrações aplicadas em 2010
Fora de circulação
Segundo a chefe de publicidade institucional do Detran/PE, Iara Lima, não há forma legal de retirar das ruas um veículo que ainda tem condições de rodar. Enquanto isso, o Detran promove fiscalizações em relação às condições dos automóveis. Nos últimos 10 anos, a entidade retirou de circulação mais de cinco mil veículos das vias por meio de leilões públicos, resultado de apreensões por débitos de trânsito não honrados pelos proprietários. Pelo menos a metade destes é considerada sucata e, nos leilões, eles são arrematados para reaproveitamento das peças.
Diferença entre antigo e velho
Carros antigos são automóveis de valor histórico, sentimental e afetivo, que marcaram momentos da vida das pessoas. Você já viu um andando pelas ruas? Pois é… Jamais confundir carro velho com carro antigo, é o que pede o vice-presidente do Clube do Automóvel Antigo de Pernambuco (Caape), José de Anchieta Gomes. “Carros antigos são veículos que arrancam sorrisos das pessoas, conservados e restaurados. Certa vez, eu estava com minha Mercedes 1971 vermelha e um homem puxando uma carroça na rua, naquele calor do Recife, olhou com admiração e fez um gesto de aprovado para mim. Eu abri o vidro e agradeci a ele em troca”, frisa. A mesma Mercedes já virou celebridade, estrelando um filme brasileiro ao lado do ator Lázaro Ramos.
Por dentro da lei
De acordo com o advogado Floriano Teixeira, a pessoa que se sentir ridicularizada, humilhada ou discriminada por um motorista ou um pedestre por conta das condições estruturais do seu veículo pode ser amparada judicialmente. “A pessoa pode pedir uma indenização por danos morais. Mas é preciso que ela reúna provas, como testemunhas, fotografe o local e anote a placa do carro”, frisa ele, afirmando que casos como esse são raros de acontecer. Lembrando que não são os veículos que sofrem discriminação, porque, segundo a Constituição Federal, o direito não concede personalidade a seres vivos que não sejam humanos e nem a seres inanimados.
Correio Braziliense
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