Prática antiquada e que retirava ganhos dos caminhoneiros, a carta-frete dá seus últimos suspiros antes de desaparecer do segmento de transporte de carga.
A recente regulamentação da lei que pôs fim a essa modalidade de pagamento estabelece que até outubro as companhias do setor terão de se adaptar, sob risco de serem autuadas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres.
A carta-frete, que existe há 50 anos, é um papel que funciona como um cheque nominal ao caminhoneiro, mas que só pode ser trocada por dinheiro em postos de combustíveis conveniados a transportadoras ou indústrias que contratam os caminhoneiros autônomos.
Além dessa limitação, a modalidade gera outra desvantagem para o profissional dos transportes: para ele receber o valor que consta no documento, é obrigado a gastar de 30% a 40% do total no local onde param para trocar o papel (por exemplo, fazendo o abastecimento de diesel). “E como têm de se esperar alguns dias para receber das transportadoras, os postos majoram os preços em 10% a 12%. É como se como se comprássemos fiado”, explica o presidente do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens no Estado de São Paulo, Norival de Almeida Silva, que festeja a mudança na legislação.
O consultor de logística Antonio Wrobleski concorda que essa prática tinha mesmo de acabar. “É uma excrescência. Era usada para pagar o caminhoneiro e se tornou documento de sonegação para muitas transportadoras. A nova lei vai privilegiar as empresas que trabalham ‘por dentro’ (ou seja, recolhendo os impostos devidos)”, afirma.
Agora, as empresas terão duas opções na hora de pagar pelo frete: ou por meio do depósito em conta bancária ou com a colocação do valor em cartão (com a possibilidade de débito ou de saque), que será operado por uma das administradoras homologadas pela ANTT.
Para o caminhoneiro Denis Francisco, que é proprietário de quatro veículos e trabalha prestando serviços a uma transportadora, a expectativa é positiva. “Não vamos ficar mais dependendo dos postos credenciados”, desabafa.
Adaptações
A nova lei, porém, exigirá adaptações das companhias. O diretor de operações da Grecco Logística, de Mauá, Hélio Marques Ramos, diz que será necessário ter capital de giro para pagar antecipadamente. “Agora teremos de ter dinheiro reservado para fazer a contratação do motorista. Antes, as companhias usavam os recursos dos parceiros (os postos de combustíveis conveniados) e depois de 15 dias, o posto me cobrava”, explica.
No entanto, Wrobleski avalia que, nos tempos atuais, em que o setor já utiliza sistemas de gerenciamento de frota e rastreamento do veículo, e há diversas formas modernas de pagamento sem o uso de dinheiro vivo (como os cartões de crédito e de débito), a prática se tornou ultrapassada. “No passado, teve sua utilidade, mas já não faz mais sentido há bastante tempo”, considera.
Autorizada quer ter 30% desse mercado
Uma das empresas homologadas em julho pela ANTT para administrar o pagamento dos caminhoneiros autônomos pelas transportadoras é a Pamcary, que oferece o sistema Pamcard.
A companhia já atuava nesse ramo desde 2004 com o gerenciamento do pagamento do frete e, com a regulamentação do fim da carta-frete, a expectativa é de que seja possível ganhar participação em vendas.
Segundo o diretor de produtos e Negócios da empresa, Felipe Dick, atualmente, a empresa tem cerca de 5% desse mercado, que movimenta de R$ 70 milhões a R$ 80 milhões por ano. A meta é alcançar fatia de 30% em dois anos. “Hoje já atendemos a 700 empresas e temos 250 mil cartões emitidos, em um universo de 1 milhão de motoristas”, cita.
Dick assinala que esse é um segmento ainda pouco explorado, mas de grande potencial. Ele lembra que um caminhão para uso rodoviário pode custar mais de R$ 200 mil. Entretanto, com as dificuldades de comprovação de renda do autônomo, a idade média da frota nessa categoria é alta: gira em 20 anos.
O cartão da companhia, que é pré-pago, é emitido pelo Bradesco e tem a bandeira Visa, traz vantagens não apenas por permitir compras (via Visa Electron) ou o saque nos caixas eletrônicos do banco, mas também agrega o vale pedágio e ainda dará comprovantes de pagamento para o profissional de transporte de cargas. Com isso ele terá mais facilidade para financiar a troca do caminhão, por exemplo, por meio de linhas do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social.
Além disso, pelo sistema, a Pamcary gerencia os pagamentos e as informações de carga, rotas, peso do veículo e quilometragem que vai ser percorrida. Dick assinala que a regulamentação da lei é direcionada ao autônomo ou à pequena transportadora que tem até três veículos, mas nada impede que uma grande empresa com frota própria use o Pamcard para gerenciar os pagamentos do frete e dos pedágios.
Fonte: Diário do Grande ABC
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